O ano de 1789 foi um marco para a história ocidental. A data marca o início da Revolução Francesa, momento no qual os ideais iluministas já presentes anteriormente na Independência dos E.U.A. (1776) ganharam ainda mais força e tomaram de assalto o poder das mãos do rei francês Luís XVI, iniciando o processo revolucionário que daria início a Idade Contemporânea (1789-).
A repercussão da Revolução Francesa atravessaria o oceano atlântico e respingaria também no Brasil, tendo como sua maior expressão a Inconfidência Mineira (1789). Também conhecida como Conjuração Mineira, a revolta nunca chegaria a acontecer, uma vez que foi delatada por um de seus participantes, e, no entanto, seria um marco nas lutas de insatisfação daqueles que moravam na colônia contra o controle metropolitano.Para que se possa compreender melhor a revolta, devemos entender os motivos que levaram a população mineira planejar um levante armado contra a coroa portuguesa, voltando um pouco mais no tempo.
Várias imagens que representaram Tiradentes nitidamente o associaram à figura de Jesus Cristo.
Em primeiro lugar, deve-se ter em mente o motivo pelo qual a Inconfidência aconteceu em Minas Gerais e não em outro território do Brasil. Com a falência da produção de açúcar no nordeste brasileiro, o ouro se tornou o principal meio de acumulação de riquezas por parte da Coroa portuguesa entre os anos finais do século XVII e início do século XVIII. Apesar de outras regiões também possuírem grandes reservas auríferas, Minas Gerais era, sem dúvida, a província que mais possuía ouro. Com a extração do minério, diversos bens e serviços se desenvolveram paralelamente, devido ao imperativo de satisfazer as necessidades mais básicas daqueles que viviam do comércio e extração aurífera.
A partir da segunda metade do século XVIII, o processo de extração do ouro começava a dar sinais de que entraria em colapso em pouco tempo. A maneira predatória de exploração nas minas, somando-se aos gastos cada vez mais exorbitantes da Coroa acarretaram um aumento na cobrança de impostos e em um descontentamento geral entre a população, não só de Minas Gerais, mas também de outras regiões. Todavia, Minas Gerais se mostrava a província mais rebelde, e havia sido palco de vários movimentos questionadores anteriormente como as revoltas de Vila Rica ou Revolta de Felipe dos Santos (1720), de Curvelo (1760-1763), de Mariana (1769), e de Sabará (1775), todas ligadas ao processo de exploração do ouro e aos atritos dos viventes com os representantes da Coroa.
Uma das poucas imagens de Tiradentes que o retratam com um ar altivo. Talvez seja a que melhor represente realmente a sua aparência real.
No ano de 1783, D. Luís da Cunha Meneses foi indicado para o cargo de governador da capitania de Minas Gerais. De caráter austero e violento, Luís Meneses aumentou a fiscalização sobre a produção aurífera dado ao fato de que a arrecadação da Coroa portuguesa não mais satisfazia suas necessidades. Ainda que o grande motivo apontado fosse o contrabando, que realmente era muito presente no Brasil, as jazidas de ouro encontravam-se já esgotadas após décadas de exploração.
Esta é uma imagem muito interessante, pois mostra ao mesmo tempo um Tiradentes associado à Jesus ao mesmo tempo em que ele resiste a sua prisão.
Ao apontar a sonegação como principal problema a ser enfrentado, a Coroa portuguesa decretou a “derrama”,que nada mais era do que a cobrança compulsória de impostos de todos aqueles que se encontravam na capitania (ainda que não participassem do processo de extração aurífera) até que a soma de 100 arrobas de ouro (1.500 kg) fossem atingidas.
Ao saberem da informação, alguns membros das classes mais abastadas de Minas Gerais assim como figuras de notório conhecimento, começaram a confabular uma revolta com a instauração da derrama. Faziam parte desse grupo de proprietários rurais, intelectuais, clérigos e militares, o contratador Domingos de Abreu Vieira, os padres José da Silva e Oliveira Rolim, Manuel Rodrigues da Costa e Carlos Correia de Toledo e Melo, o cônego Luís Vieira da Silva, os poetas Cláudio Manuel da Costa, Inácio José de Alvarenga Peixoto e Tomás Antônio Gonzaga, o coronel Francisco Antônio de Oliveira Lopes, o capitão José de Resende Costa e seu filho José de Resende Costa Filho, o sargento-mor Luís Vaz de Toledo Pisa e o alferes Joaquim José da Silva Xavier, cujo apelido eram “Tiradentes” e viria a ser tornar o principal nome da inconfidência futuramente.
Influenciados pelos ideais iluministas e pelo sucesso da Independência dos E.U.A. (1776) e da Revolução Francesa (1789), seus líderes passaram a se reunir em suas próprias casas planejando libertar o Brasil do domínio português. Nessas reuniões discutia-se os rumos para o Brasil após a sua emancipação, uma Constituição própria e quais as formas de governo poderiam ser aqui adotadas e até chegaram a elaborar a bandeira desse novo país: sua cor seria o branco (símbolo de liberdade) com um triângulo ao centro e com os dizeres “Libertas Quæ Sera Tamen” (liberdade ainda que tardia); bandeira hoje símbolo oficial do estado de Minas Gerais. Cabe aqui destacar que não havia consenso sobre alguns temas polêmicos, como a abolição da escravidão, apenas defendida pelos membros mais baixos da revolta, um deles, Tiradentes.
Imagem representando a leitura da sentença de Tiradentes. Mais uma vez ele é associado a uma imagem sagrada, ressaltando a injustiça da pena.
Com a proximidade da ocorrência derrama, um dos inconfidentes, Joaquim Silvério dos Reis, denunciou seus companheiros em troca do perdão real, o que seria copiado por outros membros da revolta. Após a instauração da devassa (nome dado aos autos do processo) iniciou-se o processo de julgamento dos acusados no qual todos alegaram não ter participado da trama, menos Tiradentes.
Por ser o único a assumir sua parcela de culpa bem como o único pobre dentre os cabeças do movimento, Tiradentes foi condenado à forca, tendo seus membros despedaçados e expostos na cidade de Vila Rica, atual Ouro Preto. Seus braços e pernas foram colocados em cada um dos cantos da cidade e sua cabeça foi posta no centro da cidade. Um detalhe curioso é que em um momento de descuido dos guardas, a cabeça de Tiradentes sumiu, sendo seu paradeiro desconhecido até os dias atuais.
Imagem retratando o corpo esquartejado de Tiradentes.
Como legado, a Inconfidência Mineira destaca-se por ter inaugurado um novo tipo de revolta, ao propor umaruptura de fato entre Brasil e Portugal e um projeto de país autônomo. Essas revoltas ficariam conhecidas também como revoltas emancipacionistas. A partir de então,Portugal viria a ter mais dificuldade para controlar a sua colônia mais importante, a mentalidade dos colonos começaria a mudar frente à exploração colonial, e, pouco tempo depois, em 1822, o Brasil se tornaria de fato um país independente.
Vinicius Carlos da Silva
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